Caso ocorreu em voo para Miami. Anac recomenda que equipamento esteja na porta no momento do desembarque, mas regras não são aplicadas fora do território nacional. Andrea, que é cadeirante, dentro de avião e fora de uma aeronave sem acessibilidade para embarque
Reprodução/Redes sociais
Depois de quase 8h de espera, Andrea Schwarz aterrissou em Miami, nos Estados Unidos, no dia 18 de junho passado e se deparou com um problema recorrente em suas viagens de avião: a falta de acessibilidade. A sua cadeira de rodas não estava na porta da cabine porque foi colocada junto com as malas, e teria que ser pega na esteira da área de desembarque (veja vídeo mais abaixo).
“O consumidor com deficiência paga o mesmo, mas ele não leva o mesmo [..]. A pior parte da viagem de avião é como vai chegar a minha cadeira”, diz Andrea.
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A empreendedora conta que ao ser comunicada de que teria que sair carregada do avião, se recusou. Depois de discutir com os funcionários em uma outra língua, e esperar pela cadeira de rodas, ela se urinou.
“Aconteceu todo esse caos, eu acabei fazendo xixi na calça. Comecei a ficar nervosa, estava super apertada porque eu não tinha ido [ao banheiro] no avião”, diz Andrea.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) recomenda que a cadeira de rodas de um passageiro com deficiência esteja na porta da cabine no momento do desembarque. Mas a regra não se aplica aos procedimentos de embarque e desembarque realizados fora do território nacional. 🦽
Em 2023, a Anac recebeu 616 reclamações relacionadas à assistência dada aos passageiros com Necessidade de Assistência Especial (PNAE).
Vídeo nas redes sociais
Andrea conta que cadeira de rodas não estava no momento do desembarque do avião.
No vídeo que publicou nas redes sociais, Andrea – que é a fundadora de uma consultoria especializada na inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho – explica a situação do sumiço da cadeira de rodas (veja acima).
A empreendedora conta que viajou para Miami com uma companhia brasileira e que, para ela, as recomendações da Anac para acessibilidade deveriam ser respeitadas. A agência reguladora diz que se o transporte da cadeira de rodas não for feito dentro da cabine de passageiros, o equipamento despachado deve ser disponibilizado no momento do desembarque da aeronave.
Falta de acessibilidade nos voos🦼🦽✈️
A situação em Miami não foi a primeira em que Andrea precisou discutir por causa da falta de acessibilidade em uma viagem de avião. Sua cadeira já foi quebrada, devolvida sem um braço, ou com o eixo fora do lugar.
Além disso, ela conta que já precisou ser carregada várias vezes pelo marido para poder embarcar ou desembarcar de aeronaves. Isso aconteceu em viagens dentro e fora do Brasil.
“Essa situação acontece porque o procedimento não é inclusivo. O atendimento humano naquele momento pode suprir essa falta de acessibilidade muitas vezes, se o funcionário tiver sido bem treinado. Mas, na maior parte das vezes, a gente fica sem opção. Inclusive no atendimento a gente é maltratado pelos atendentes, é como se fizessem um favor”, diz Andrea.
Andrea denuncia que pessoas com deficiência acabam sendo expostas e prejudicadas enquanto consumidores. “As pessoas não conseguem me enxergar da forma que eu sou e da forma que eu me vejo. Parece que toda vez, mesmo eu pagando, eu sou uma consumidora que tem direitos a menos, eu não parto do mesmo ponto”, afirma.
A jornalista Laís Serrão também já passou por situações constrangedoras durante voos. Em uma viagem para a Alemanha, quando foi visitar a irmã que mora no país europeu, a cadeira de rodas “sumiu” durante uma conexão em Amsterdã.
“A cadeira simplesmente não apareceu na Alemanha. Tive que passar minha viagem sem locomoção nenhuma e tendo que ir ao banheiro, por exemplo, com a ajuda da minha mãe e sem poder fazer passeios e curtir a viagem”, diz Laís.
A jornalista só “reencontrou” a cadeira de rodas um mês depois, quando desembarcou no Brasil na volta da viagem. Em outros voos, a cadeira já chegou amassada, riscada, com freio, aros e encaixe do assento danificados.
Laís Serrão é jornalista e usa cadeira de rodas; ela reclama da falta de cuidados com o equipamento durante viagens de avião
Reprodução/Redes sociais
Em 2016, quando foi ser voluntária nas Paralimpíadas do Rio de Janeiro, Laís Serrão encarou mais uma vez o problema, mas com uma cadeira motorizada. 🦼 O equipamento chegou, mas não funcionou.
“Penso que a cadeira deveria embarcar comigo, ficar na cabine comigo. Ficaria muito mais segura. É como ir num restaurante e ao deixar minha cadeira de rodas ao lado da mesa, o garçom pede para colocá-la em outro lugar. Fecho a conta na hora”, diz Laís.
O que diz a legislação❓
O passageiro com Necessidade de Assistência Especial (PNAE) tem uma norma específica da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para garantir a assistência durante voos: a resolução n° 280, de 2013.
Segundo o documento, a empresa aérea é responsável por prestar assistência ao PNAE desde o check-in até o acesso à área pública, após o desembarque.
Veja quem pode solicitar assistência especial:
Pessoas com deficiência,
Idosos a partir de 60 anos,
Gestantes e lactantes,
Pessoas com criança de colo,
Pessoas com mobilidade reduzida, ou
Qualquer pessoa que, por alguma condição específica, tenha limitação na sua autonomia como passageiro.
De acordo com a Anac, a empresa aérea deve transportar gratuitamente a ajuda técnica empregada para a locomoção do PNAE, limitada a uma peça:
Na cabine da aeronave, quando houver espaço adequado;
No compartimento de bagagem da aeronave, devendo o equipamento ser disponibilizado ao PNAE no momento do desembarque da aeronave.
Nos casos de perda ou danificação dos equipamentos, as empresas devem disponibilizar um item equivalente até a solução do problema. Além disso, a Anac recomenda que a empresa pague uma indenização no valor de mercado do produto no prazo de 14 dias.
Onde reclamar❓
A recomendação da Anac é que os passageiros busquem primeiro os canais de reclamação das empresas aéreas. Caso o problema não seja resolvido, as plataformas de reclamação são:
Página do reclamação do consumidor: clique aqui
Central de atendimento da Anac: ligue 163 (atendimento 24h, em português, inglês e espanhol)
Para Andrea Schwarz, especialista na área de inclusão de pessoas no mercado de trabalho, há três pontos que precisam de atenção e mudança no serviço aéreo para pessoas com deficiência:
Entendimento de que não é um favor que a sociedade faz pra pessoas com deficiência
Atendentes têm que ser treinados e orientados para um atendimento digno, desde o despacho da cadeira até na forma de lidar com situações embaraçosas
Olhar a pessoa com deficiência na sua totalidade
“Somos cidadãos, temos deveres e direitos, mas parece que a gente não é. Vão tirando nosso poder de escolha, de consumo e de mercado de trabalho a todo momento”, diz Andrea Schwarz.
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