Dividida em cinco capítulos, mostra, em cartaz até 28 de fevereiro, mescla arte contemporânea com fotografias, pinturas e até pesquisas climáticas. Paulo César Marins, diretor do museu, afirma que montagem desafia o olhar da instituição para o seu próprio acervo de obras. Exposição temporrária “Onde Há Fumaça” em exibição no Museu do Ipiranga
Aline Freitas/g1
Nova exposição temporária do Museu do Ipiranga, na Zona Sul de São Paulo , reconta a história das paisagens brasileiras a partir da visão da destruição natural. Em um mix de pinturas clássicas de acervo, obras contemporâneas, elementos táteis, fotografias, exibições audiovisuais e até pesquisas científicas, curadoria convida o visitante a reavaliar décadas de relação destrutiva da sociedade brasileira com elementos ambientais.
“Onde Há Fumaça” fica em cartaz até 28 de fevereiro no subsolo do museu. As entradas vão de R$ 15 a R$ 30 e há gratuidade às quartas-feiras.
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Desafiando a visão do Ipiranga
Dividida em cinco capítulos, a exposição marca a primeira vez, desde a reabertura, que o espaço utiliza curadoria externa. A responsabilidade é do grupo Micrópolis, formado pelo trio de arquitetos Felipe Carnevalli, Marcela Rosenburg e Vítor Lagoeiro.
Para Paulo César Marins, diretor do Museu do Ipiranga, a decisão não só auxilia o museu na busca de novas narrativas como desafia os símbolos criados pela própria galeria.
“É muito importante trabalhar com pontos de vista externos que possam, inclusive, lançar um olhar desafiador para as nossas coleções. Isso é muito importante para disparar novos olhares, mas também para estabelecer diálogos, por exemplo, trazendo a arte contemporânea para um museu cujo principal símbolo é um bandeirante”, diz.
Já Lagoeiro aponta que mudar a forma de olhar para o acervo é algo inevitável. “A nós, sempre interessou esse exercício de promover novos olhares e novas interpretações sobre as imagens, porque eu acho que é uma forma da gente tornar a história mais plural, o entendimento da história mais plural”, completa.
Quadro “Várzea do Carmo e rio Tamanduateí”, de José Wasth Rodrigues
Aline Freitas/g1
Abertura e a relação com a política
Quadro “Independência e Morte”, de Jaime Lauriano
Aline Freitas/g1
O epílogo da mostra exibe ao público o quadro “Independência e Morte”, de Jaime Laurentino. A alusão a mais famosa obra do Museu do Ipiranga – “Grito de Independência”, de Pedro Américo – é proposital e conversa com a análise de Marins, da intenção de revisitar o acervo do museu.
Em cima da pintura de Laurentino, bonecos representando movimentos políticos como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e a luta antirracista enfrentam figuras combativas que estavam presentes na obra original de 1888.
O curador diz não ser possível retratar o tema sem menção à política. “Não tem como a gente separar uma coisa da outra porque a política tá implicada na nossa vida cotidiana”, conta. “Muito do que se vivencia em relação de efeitos da emergência climática são resultados de escolhas políticas.”
Marins concorda com o pensamento. “Nós não vamos conseguir controlar os danos da natureza no Brasil sem decisões políticas.”
Monocultura
O primeiro capítulo da exposição é rodeado de obras do acervo de artistas como Henrique Manzo e Alfredo Norfini. Apesar de darem enfoque às relações sociais das grandes fazendas de café do século 19, o intuito aqui é mostrar como essa atividade precisava da devastação da natureza ao seu redor.
A problematização da escravidão não é ignorada, com pinturas, fotos e até camisetas expondo a realidade da época. Frases descrevendo cenas que evidenciam o racismo estrutural da sociedade brasileira também compõe o espaço.
“Eu acho que é impossível a gente pensar a monocultura sem relacionar a prática da monocultura com o latifúndio e o trabalho escravo. São pilares que sustentam essa prática que culminou em tanta degradação ambiental”, afirma Lagoeiro.
Peças da exposição “Onde Há Fumaça”
Aline Freitas/g1
Domesticação
Voltada à crítica da relação destrutiva com os animais, essa segunda etapa exibe obras que interligam a relação de poder do homem com a violência contra os animais. Aqui, o protagonismo fica por conta das obras de Alice Lara e das pesquisas que mostram o aquecimento das temperaturas no Brasil.
Mesmo destacada no segundo capítulo, essa última parte é explorada durante toda a exposição com tecidos que mostram a evolução da temperatura média das cidades com o passar dos anos. Quanto mais perto do marrom, mais quente.
Veja abaixo a evolução da temperatura da capital paulista:
Elemento de exposição “Onde Há Fumaça” mostra evolução da temperatura na cidade de SP
Pavimentação
Em “Pavimentação”, a exposição explora a relação do crescimento das cidades com o solo. A transformação das paisagens em asfalto e a necessidade de uma reparação ambiental. Através das fotografias de Uýra Sodoma, o capítulo retrata a relação humana com a resistente natureza urbanizada.
Outro destaque neste pedaço é a obra Tríptico de São Paulo visto da Várzea do Campo, de Henrique Manzo. Destacada por Marins, o quadro, nesta posição, convida o visitante a repensar o conceito de progresso e sua relação com a natureza.
Quadro “Tríptico de São Paulo visto da Várzea do Carmo”
Divulgação
Transbordamentos
Aqui, o objetivo é explorar a relação das cidades brasileiras com os rios. Com duas exibições em audiovisual, a penúltima fase da exposição retrata como as águas, antes utilizadas para lavar roupas e até como fonte para os animais, passaram a ter uma visão de sujeira e contaminação pela sociedade.
Vídeo exiido em exposição “Onde Há Fumaça”
Força geológica
Na última etapa, a exposição chega a sua fase com menos pinturas e mais esculturas. Aqui, o intuito é demonstrar os processos, feitos pelos humanos, que degradaram o solo fértil de nossas terras.
Diorama da fotografia/Terra Preta Indígena
Aline Freitas/g1
Sem respostas, mas com reflexão
Ao final, o visitante não se vê diante de uma exposição que dá soluções para a questão ambiental. Para o curador Vítor Lagoeiro, tentar pensar em uma resposta seria pretensioso.
“Eu acho que é o objetivo mesmo é colocar em pauta. Abrir o debate para todo mundo que passa por ali entrar nessa mesa de discussão junto com a gente”, diz. “Então, eu acho que realmente ela não tem o objetivo de encontrar soluções, mas ela tem um objetivo de colocar a crise climática numa perspectiva histórica.”
Já o diretor do espaço, Paulo César Marins, diz que a resposta está nas entrelinhas. “Acho que tem alguns sinais que mostram algumas formas de tomada de consciência e de uma relação mais respeitosa que as comunidades indígenas nacionais, que estão vivas, têm”, conta.
Serviço
“Onde Há Fumaça”
🗓️ Quando? De 5/11 a 28/2/2025
📍Onde? Museu do Ipiranga | Parque da Independência – Ipiranga, Zona Sul
💲Quanto? De R$ 15 a R$ 30 (o acesso é grátis às quartas-feiras)
➡️Mais informações
*Sob supervisão de Paula Lago