Ivo Noll, de 66 anos, vive de aluguel social em Venâncio Aires (RS) depois que a vila em que morava, no distrito de Mariante, ser devastada pelas enchentes históricas de maio de 2024. Após 66 anos, idoso abandona casa em vila gaúcha atingida pelas enchentes
No terreno que antes abrigava lares agora se vê casas destruídas, estruturas abandonadas e destroços cercados pelo matagal que cresce depois que a água baixou na Vila Mariante, distrito de Venâncio Aires (RS), arrasada pelas enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul em maio deste ano.
O g1 esteve em Mariante logo após as enchentes atingirem a região, mostrou os impactos das inundações e o sofrimento das pessoas atingidas pela tragédia (relembre aqui). Sete meses depois, série de reportagens mostra a realidade da vila, dividida entre a destruição e o desafio de um novo recomeço.
Ivo Noll, de 66 anos, acompanhou a equipe de reportagem e voltou pela 1ª vez em 7 meses ao lugar onde vivia e que ficou submerso pelas águas do Rio Taquari. Segundo ele, a visita também será a última.
Depois da tragédia, Ivo e o marido, Adelar Laerte dos Santos, vivem em uma casa fora do distrito, em Venâncio Aires. O espaço é pago com aluguel social da Prefeitura, e os dois pretendem abandonar Mariante de vez.
“Não tem futuro mais para mim aqui”, define Ivo, após sentir o impacto de ver a casa cheia de barro e com as paredes pintadas com o marrom da lama.
Ivo Noll em frente à casa em que morava em Mariante
Fábio Tito/g1
“Desmoronou tudo. Nem paguei a casa ainda e estou sem ela. Por isso que eu digo: o que eu quero aqui ainda? Eu com 66 anos, já tive dois derrames, quase não consigo caminhar, o que eu quero aqui?!”, diz, fazendo não com a cabeça. “É triste a gente ver”.
Ivo lamenta a situação, que se repete na região, considerada de risco e que vive com ameaças de novas inundações. “No ano passado foram duas enchentes grandes e nas duas vezes eu perdi tudo dentro de casa. Comprei tudo novo, consegui tudo novo, acabei perdendo tudo de novo”.
Laerte busca pertences que podem ser reutilizados
Fábio Tito/g1
Ivo terá o benefício até novembro de 2025, data em que o município pretende entregar todas as 300 casas prometidas aos moradores atingidos pelas enchentes — parte será construída e outra será adquirida e doada a partir de um programa da Caixa Econômica Federal.
Ivo buscou um ventilador que estava na antiga casa e tentará salva-lo
Fábio Tito/g1
Outros moradores, porém, reclamam da falta de apoio para reconstruir a vila e cobram a reabertura do posto de saúde que atendia Mariante. As pessoas que cobram o poder público querem também a volta do colégio — que é estadual e depende de decisões do governo Eduardo Leite (PSDB) para reabrir ou fechar de vez.
Hoje, o que resta da escola é um prédio abandonado com destroços e centímetros de barro onde antes eram salas de aula.
Ivo (à dir.) e Adelar Laerte na casa em que moram temporariamente em Venâncio Aires (RS)
Fábio Tito/g1
O prefeito de Venâncio, Jarbas da Rosa (PDT) afirma que o município fez um mutirão para limpeza das casas de quem decidiu voltar a Mariante. Segundo ele, existe a possibilidade de os moradores reconstruírem os imóveis que já existiam na Vila Mariante, sem construir novos prédios.
“Nós temos uma questão de responsabilidade do gestor público que é com relação à reocupação das áreas. Nós temos a APP [Área de Preservação Permanente] que tem que ser cumprida. Grande parte dessas casas destruídas estavam em APP porque são construções que tinham 50, até 100 anos”, diz.
Sobre o posto de saúde, o prefeito afirmou que precisa de limpeza e pintura, o que devem ser feitos até o início do ano para reabertura do local. Até lá, diz que o município oferece atendimento em uma unidade móvel que vai a Mariante duas vezes na semana.
Jarbas Rosa (PDT), prefeito de Venâncio Aires (RS)
Fábio Tito/g1
Ao g1, o governo do Rio Grande do Sul afirmou que promoveu ações na região de Venâncio Aires “desde os primeiros dias da enchente”, com repasses que somam R$ 7,9 milhões em recursos para a cidade, entre benefícios sociais às famílias, apoio a empresas locais, reformas de hospitais, unidades de saúde, de educação e infraestrutura.
O governo federal, gerido por Lula (PT) afirmou que destinou até o dia 13 de dezembro mais de R$ 200 milhões em recursos para Venâncio Aires (RS), entre valores para o cuidado com as pessoas, apoio às empresas e medidas gerais para o município.
O governo Lula estima em R$ 58,5 bilhões o total de verbas destinadas para a reconstrução do Rio Grande do Sul após as enchentes de maio.
teto e forro da antiga casa de seu Ivo
Fábio Tito/g1
Abrigo onde Ivo e ficou com mais quase cem pessoas logo após as enchentes
Fábio Tito/g1
Local agora está vazio, bem diferente de maio, quando 98 pessoas viviam por lá de forma improvisada
Fábio Tito/g1
Entulhos da antiga penitenciária, derrubada para dar lugar a dezenas de casas
Fábio Tito/g1