Suyany Breschak, que é uma mulher de origem cigana, é investigada junto com Júlia Cathermol em um inquérito que apura o homicídio de um empresário. O presidente da rede pede uma apuração transparente e sem preconceitos. Calon Rogério, presidente da Rede Brasileira dos Povos Ciganos
Reprodução/Francisca Silva
O termo “cigano” foi muito citado no noticiário policial do Rio nas últimas semanas, desde que Suyany Breschak foi presa, suspeita de ser a mandante da morte de um empresário no Engenho Novo, na Zona Norte do Rio.
O g1 conversou com o presidente da Rede Brasileira dos Povos Ciganos, que explicou algumas diferenças entre os povos ciganos e pediu uma investigação transparente e sem preconceitos no caso. A associação atua em 12 estados de 4 países ajudando a promover direitos humanos e políticas públicas para os povos ciganos.
O administrador de imóveis Luiz Marcelo Ormond foi encontrado morto dentro de seu apartamento no dia 20 de maio. Cerca de uma semana depois, a cigana foi presa pela polícia. Para os investigadores, ela tramou a morte do homem junto com a namorada dele, Júlia Andrade Cathermol Pimenta, que foi capturada dias depois.
Suyany é uma mulher que vem de uma família de ciganos e se apresentava como “Cigana Esmeralda” nas redes sociais. Segundo depoimentos ouvidos pela polícia na investigação, Júlia pagava a ela uma dúvida de R$ 600 mil, contraída depois que Suyany realizou trabalhos espirituais para ela.
O presidente da rede, o calon Rogério Ribeiro, explica que ser cigano não é uma religião.
“Não tem nem predominância de religião, muitos são evangélicos, por exemplo. Nascer cigano não é um desvio de caráter. Muitos ciganos escondem suas origens com medo do preconceito da sociedade”, destaca o calon Rogério Ribeiro.
“Esse preconceito fere o princípio da igualdade racial. Falam que somos trapaceiros, violentos, mas se fosse assim os presídios estariam lotados de ciganos”, completa ele.
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De acordo com o historiador da UERJ, Marcus Dezemone, os ciganos têm tradições, costumes e uma identidade comuns, por isso são uma etnia. Para ser cigano, é preciso ter descendência cigana, sendo assim, não é algo que você pode se tornar por vontade própria.
Mesmo sendo uma etnia, não há uma predominância política ou religiosa. Cada cigano é livre para escolher uma religião a ser seguida ou não, por exemplo.
“Estudos genéticos apontam uma origem comum no norte da atual Índia, mas pelo menos três grandes grupos podem ser identificados: os provenientes da península ibérica são conhecidos como calón ou calão. Já os do leste Europeu são chamados de Roma ou Rom; e nas regiões germânicas, de Sinti”, explica o historiador.
Assim como com outras etnias, há preconceito com o povo cigano nas sociedades.
“Quando se é cigano, já tem uma polêmica. O que queremos é que o inquérito seja feito de forma ética, sem preconceito, que seja feita uma investigação com transparência e sem achismos, porque o racismo institucional é muito grande. Muitos crimes com maior crueldade não tomam essa repercussão, a polêmica maior é por ela ser cigana?”, questiona Rogério.
“Nada impede que a Suyany possa ter influenciado ou atuado mesmo como mandante, como em outros crimes, com motivação financeira, feito por pessoas que não são ciganas”, emenda o Dezemone.
O historiador destaca ainda que o preconceito contra os ciganos vem da sociedade enxergá-los como diferentes e não pertencentes aos seus povos. Segundo Marcus, a perseguição é histórica e, inclusive, eles foram mortos na Segunda Guerra Mundial.
“Esse tipo de ação leva à indiferença com esse povo, até perseguições. Os ciganos também foram enviados para campos de concentração e extermínio na guerra, mas isso é pouco falado. As estimativas dos historiadores é de 200 a 500 mil ciganos exterminados na Alemanha nazista”, conta ele.
Para o historiador, a repercussão do caso do brigadeirão demonstrou que na sociedade brasileira ainda há muito preconceito com esse povo.
“Não há nenhuma contradição entre nascer cigano e ser trabalhador. É a mesma lógica dos moradores das favelas. Tem-se o mito de que todo mundo que mora na favela é bandido, e a gente sabe que não é bem assim, que os moradores são trabalhadores, honestos. A gente precisa combater esse preconceito”, afirma.
Assista à reportagem sobre o caso:
Crime do brigadeirão: namorado de ‘cigana’ diz que viu suspeitas moerem remédio