30 de setembro de 2024

No Líbano, irmãs brasileiras sofrem com a perda de parte da família atingida por um míssil: ‘Acabou com a minha vida’

Raquel Chanarek Hamia morava no Vale de Beeca. Ela sobreviveu, mas o marido, as filhas e o neto morreram: ‘A gente está na rua, não tem outro lugar para sobreviver’. Fantástico mostra drama de irmãs brasileiras que perderam parte da família em explosão no Líbano
Os ataques de Israel a regiões do Líbano continuaram durante a semana. Já são quase 800 mortos, entre eles pelo menos cinco brasileiros. O fotógrafo e documentarista Gabriel Chaim está no Líbano desde julho.
“A situação aqui está completamente fora do controle, e a população está toda fugindo desesperadamente. A multidão de carros na minha frente é impressionante. Eu só vi isso no Iraque, quando eu estava cobrindo a guerra em Mosul”, conta Gabriel Chaim.
A brasileira Raquel Chanarek Hamia perdeu quatro pessoas de sua família em um ataque. Na última sexta-feira, dia 27, Gabriel, com a ajuda de um tradutor, conversou com Leila Charanek Hamia, irmã de Raquel.
Leila tem 53 anos e nasceu em São Paulo. Seus pais eram libaneses que se mudaram para o Brasil. Tiveram três filhos: Leila, a irmã Raquel e o irmão Lutifi.
Leila Charanek Hamia: Lembro que a vida lá era melhor, a situação era melhor.
Gabriel Chaim, documentarista: Qual é a memória que mais te toca, algum lugar específico quando lembra do Brasil?
Leila: A casa dos meus pais, onde morava, a escola e meus amigos.
Gabriel Chaim: E os amigos, não mantiveram contato?
Leila: Não, desde que eu vim para o Líbano, não sei nada deles e… Tenho vontade de ir para o Brasil, visitar o túmulo dos meus pais.
O irmão de Leila, Lutifi, também morreu em São Paulo. Ela e a irmã se mudaram para o Líbano um pouco depois de se casarem com libaneses. Raquel tinha 26 anos e Leila, 20. Os pais de Leila deixaram bens no Brasil. Ela e a irmã Raquel vinham tentando acessar alguns fundos que estão no inventário. As duas irmãs também queriam se mudar com a família para um lugar mais seguro.
“Queríamos garantir um futuro bom para eles viverem uma vida diferente dessa vida aqui. Não viram nada da vida, só guerras e bombas o tempo todo”, afirma Leila.
No último dia 16, Leila fez um pedido à Justiça brasileira. No documento, a que o Fantástico teve acesso, ela solicitava “prioridade na tramitação” do caso, pois sua família corria risco de morte. Mas não deu tempo. Sete dias depois, um míssil atingiu a casa onde a irmã dela, Raquel, estava, no Vale de Beeca. Raquel sobreviveu, mas o marido Duraid, as filhas Latifa e Ghazale, e o neto Husni, todos morreram.
“Não estou acreditando ainda que eles morreram, meus sobrinhos. Acabou com a minha vida. Desde criança, convivi com eles, pegava no colo… E agora, foram embora”, lamenta Leila.
No Líbano, irmãs brasileiras sofrem com a perda de parte da família atingida por um míssil: ‘Acabou com a minha vida’
Fantástico/ Reprodução
O marido e as filhas de Raquel eram cidadãos brasileiros, e a família estava tentando obter a cidadania para o neto que morreu. Leila ouviu a voz da irmã pela primeira vez depois do ataque.
“Muito difícil falar, meu coração não aguenta mais, está muito machucado. Depois desse trauma, só quero ficar ao lado dela”, diz Leila.
O Fantástico conversou com Raquel na manhã deste domingo (29).
“Não sei nem o que dizer. Estou muito, muito mal. Todos morreram: meu neto, duas filhas, meu marido”, diz Raquel Chanarek Hamia.
Ela fez um apelo ao governo brasileiro.
“A melhor coisa que a embaixada, o Itamaraty, poderia fazer é achar um lugar seguro para colocar as pessoas brasileiras que não têm nada a ver com essa guerra que está acontecendo no Líbano”, afirma Raquel.
Em mensagem ao Fantástico, o Itamaraty disse que a embaixada brasileira em Beirute continua em contato com as autoridades libanesas sobre o caso, mas até a tarde deste domingo (29) no Brasil não havia sido possível confirmar oficialmente as mortes. A mensagem também diz que a embaixada enviou uma lista de abrigos do governo libanês a Raquel e que também oferecerá auxílio financeiro, no âmbito da assistência consular para apoio em gastos com remédios e curativos.
Raquel está internada na cidade de Balbeque.
“Minhas pernas estão quebradas, a perna da minha filha também está. Depois do hospital, a gente está na rua. Não tenho mais nem condições de como sobreviver”, questiona.
O fotógrafo Gabriel Chaim visitou o abrigo onde estão três netos de Raquel que sobreviveram aos ataques.
Fantástico/ Reprodução
O fotógrafo Gabriel Chaim visitou o abrigo onde estão três netos de Raquel que sobreviveram aos ataques.
“Quando os ataques começaram, a gente estava na varanda e vimos os mísseis e os caças. Corri e me joguei no colo da minha avó Raquel porque o barulho das explosões estava muito alto. Minha mãe se foi e ela era tudo para mim. O que pode sobrar de bonito nessa vida se ela foi embora?”, pergunta uma das netas de Raquel.
Leila teve que deixar sua casa em Beirute por causa dos ataques. Por enquanto, ela e a família estão dormindo na rua, no calçadão da praia, assim como muitas outras famílias libanesas que não têm para onde ir.
“Saímos com a roupa do corpo. Fugimos dos bombardeios no nosso bairro”, conta Leila.
Ali Hamia é o único dos quatro filhos de Leila que nasceu no Brasil.
“A embaixada brasileira está tentando de tudo. Quero tirar os meus irmãos daqui e trazer a minha tia para morar com a gente. Queremos ficar todos juntos”, diz Ali.
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