26 de outubro de 2024

Nove anos depois do desastre de Mariana (MG), novo acordo tenta reparar danos de uma das maiores tragédias ambientais do país

Nesta sexta-feira (25), o governo federal, os estados de MG e ES, o Ministério Público, a Defensoria e mineradoras assinaram acordo para a reparação integral dos danos. União, MG, ES e mineradoras assinam acordo de R$170 bi pra reparar danos da tragédia de Mariana
Nove anos depois de um dos maiores desastres ambientais do Brasil, o governo federal, os estados de Minas Gerais e Espírito Santo e mineradoras assinaram um novo acordo para reparar os danos da tragédia de Mariana, em Minas Gerais.
“Perdemos tudo que tínhamos e tudo que tínhamos construído, como sonhos, toda a expectativa de vida. Está tudo soterrado debaixo da lama”, diz Mônica dos Santos, vítima de Mariana.
A tragédia foi em 2015. A barragem de Fundão, da mineradora Samarco, controlada pela Vale e BHP, se rompeu, despejando mais de 44 milhões de m³ de rejeitos de minério de ferro. O desastre matou 19 pessoas e espalhou destruição na bacia do Rio Doce, em Minas Gerais, com danos até a foz do rio, no Espírito Santo, e no Oceano Atlântico. Quarenta e nove municípios foram atingidos.
Um ano depois, foi feito o primeiro acordo para indenizar as vítimas, e criada a Fundação Renova, para cuidar das ações de reparação de danos. Nove anos depois, segundo a Advocacia-Geral da União, a Fundação Renova só conseguiu indenizar 112 mil pessoas.
Nesta sexta-feira (25), no Palácio do Planalto, o governo federal, os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, o Ministério Público, a Defensoria e mineradoras assinaram um novo acordo, agora para a reparação integral dos danos.
“Nós não queremos que tragédias dessa magnitude, dessa ordem, aconteçam novamente. Uma das questões mais importantes que temos aqui é a possibilidade de evitarmos novas tragédias”, disse Jorge Messias, advogado-geral da União.
Em 2018, o caso foi parar na Justiça britânica. Uma ação coletiva cobra indenização de R$ 230 bilhões. O julgamento começou esta semana em Londres.
Nove anos depois do desastre de Mariana (MG), novo acordo tenta reparar danos de uma das maiores tragédias ambientais do país
Jornal Nacional/ Reprodução
O presidente do STF – Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, disse que seria ruim para o Brasil se a solução viesse pela Justiça estrangeira e, por isso, pediu empenho ao presidente Lula para que as partes chegassem a um acordo. Caberá ao STF a homologação.
“Se tratava de um acidente ocorrido no Brasil por uma empresa formalmente brasileira e que vitimou brasileiros. Seria muito ruim, não que houvesse nada em si errado, mas seria ruim que a solução desse problema viesse de uma decisão da Justiça estrangeira. Não é questão de soberania, mas é questão de um Judiciário que tinha a capacidade de fazer com que esse problema fosse resolvido e superar o histórico de tragédias mal resolvidas na história brasileira”, afirmou Luís Roberto Barroso, presidente do STF.
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O novo pacto renegocia o acordo firmado em 2016, que foi avaliado como insuficiente para assegurar os direitos dos atingidos a uma reparação justa e satisfatória. O novo acordo também deve garantir a recuperação ambiental de áreas atingidas pelo desastre.
A Fundação Renova foi extinta.
O acordo prevê medidas estimadas em R$ 170 bilhões divididos em três frentes:
R$ 38 bilhões, que segundo o governo já foram pagos pelas mineradoras;
R$ 100 bilhões, que serão repassados para os governos de Minas Gerais, do Espírito Santo e para a União;
R$ 32 bilhões para ações de indenização e ressarcimento.
O governo estima que mais de 300 mil pessoas que perderam suas casas ou trabalho serão indenizadas com:
R$ 35 mil para quem não foi contemplado em indenizações anteriores;
R$ 95 mil no caso de pescadores e agricultores atingidos.
As indenizações terão que ser pagas em até 150 dias. As empresas também estão obrigadas a reassentar e construir moradias para 261 famílias atingidas.
O governo estima que mais de 300 mil pessoas que perderam suas casas ou trabalho serão indenizadas
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Os R$ 100 bilhões que serão repassados aos governos deverão ser pagos em até 20 anos e serão usados para o pagamento de:
um salário mínimo e meio por mês, por até quatro anos, para pescadores e agricultores atingidos;
investimentos em programas de geração de emprego e renda;
saúde, infraestrutura e equipamentos, além de repasses para o SUS;
projetos de recuperação e compensação ambiental, além da recuperação da Bacia do Rio Doce e da liberação gradual da pesca na região.
O dinheiro também será usado para investimentos em saneamento básico; em um fundo perpétuo para enfrentamento das consequências da tragédia – como retirada da lama, recuperação do solo e na infraestrutura dos municípios -; na melhoria das rodovias federais da bacia do Rio Doce; e para indenizar e custear políticas públicas específicas para as comunidades indígenas e tradicionais afetadas.
Os 49 municípios atingidos também receberão repasses.
“A gente não recupera vidas que perdemos, a gente não tem nenhuma possibilidade dessa recuperação. Mas a gente pode melhorar o ambiente onde essas pessoas hoje estão vivendo”, disse o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, do PSB.
“Estamos aqui hoje corrigindo um erro histórico, que acho que bem intencionado, mas que não deu resultado: a Fundação Renova. A partir de agora, sim, as obras vão acontecer, as pessoas vão ver que suas vidas estarão melhorando”, afirmou o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, do Novo.
Nove anos depois do desastre de Mariana (MG), novo acordo tenta reparar danos de uma das maiores tragédias ambientais do país
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Os presidentes das mineradoras estavam presentes, mas não fizeram discursos.
O presidente Lula chegou no fim da cerimônia – o primeiro compromisso no Palácio do Planalto depois da queda no banheiro do Alvorada, no sábado (19). Em uma imagem, do repórter cinematográfico Humberto Souza, dá para ver os pontos na nuca. No discurso, Lula chamou de irresponsabilidade o que aconteceu em Mariana e cobrou o cumprimento do novo acordo.
“Essa lição que as mineradoras estão tendo de que ficaria muito mais barato ter evitado a desgraça; eu espero que sirva de lição para outras centenas de lixo que as empresas jogam em represas, nem sempre tão bem preparadas, nem tão modernas para evitar uma outra desgraça dessa. É importante que essa lição fique desse acordo”, disse Lula.
Morador de Paracatu de Baixo, o lavrador Marinho Dangelo Júnior perdeu propriedades e trabalho. Ele não foi a Brasília, mas aguarda os resultados práticos do acordo.
“A gente ainda vive um empobrecimento forçado, perdendo a renda. Vivo hoje uma vida imposta, uma moradia alugada, onde eu não consigo me organizar, planejar. Vivo nove anos no retrocesso”, afirmou.
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