O podcast do g1 foi produzido pela equipe de economia do Jornal Nacional em São Paulo. Cada novo episódio ficará disponível às segundas-feiras – 4 no total. Está no ar, no G1, o Podcast “O Último Plano”
O g1 lançou nesta segunda-feira (1º) o primeiro de quatro episódios do podcast “O último plano”, que conta os bastidores da criação do real, moeda que mudou os rumos da economia no país há 30 anos.
Era uma vez um Brasil com uma inflação anual de quase 5.000%. Dinheiro perdia valor tão rápido que obrigava o consumidor a correr para o mercado assim que recebia o salário.
“As maquininhas de remarcar preços trabalhavam para valer. O efeito está na cara do freguês, que divide o espaço com o batalhão de remarcadores e reclama”.
Era muito diferente dos dias de hoje. Desde os anos 2000, a inflação do ano todo só passou três vezes dos dois dígitos. Antes do real, por exemplo, a inflação chegou a 82% ao mês. Isso foi em março de 1990. Ou seja, os aumentos eram diários, sem sossego.
Esse caos, ano após ano, derrotou diferentes governos. Planos para derrubar a inflação não faltaram. Todos fracassavam. Como o que criou, em 1986, os fiscais do Sarney.
“Cada brasileiro ou brasileira será e deverá ser um fiscal dos preços”, disse o então presidente José Sarney em 28 de fevereiro de 1986.
Planos que geraram revolta, como o confisco da poupança, no governo Collor, na década de 1990.
“Quem tem no depósito à vista, quem tinha ontem no depósito à vista 50 mil cruzados, pode ir ao banco na segunda-feira e sacar, se quiser, 50 mil cruzeiros. A parte excedente a esses 50 mil fica depositada no banco”, disse Zélia Cardoso de Mello, então ministra da Economia, em 16 de março de 1990.
“Ainda está muito complicado, não dá para entender por enquanto. E saques de só 50 mil cruzados realmente na caderneta de poupança limitam demais, inclusive a compra de bens de consumo duráveis”, afirmou a jornalista Lillian Witte Fibe na ocasião.
Até que um grupo de economistas, liderados pelo então ministro da Fazenda – e depois presidente – Fernando Henrique Cardoso, criou um plano que finalmente derrotou a inflação: o Plano Real.
“Reconhecido como algo inédito no mundo todo, e que acabou trazendo essa estabilidade para o Brasil, que parecia algo crônico, sem solução, fora dos manuais de economia. Porque, normalmente, as pessoas acreditavam, os economistas acreditavam, que o jeito de controlar a inflação era parar de emitir moeda”, diz Renata Ribeiro, repórter e apresentadora do podcast.
“Todo mundo está cansado. O Brasil cansou dessa alta de preços. Eu também cansei”, afirmou Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Fazenda, em 13 de novembro de 1993.
‘O último plano’: podcast conta os bastidores da criação do real, moeda que mudou os rumos da economia no país há 30 anos
Jornal Nacional/ Reprodução
E como em todo momento importante, o jornalismo estava atento, registrando tudo.
Repórter: Foi um trabalho de arqueologia para você que não viveu essa época?
“O arquivo da Globo é enorme, tem muita coisa dos anos 1980, dos anos 1990, reportagens”, diz Renato Ghelfi, produtor do podcast.
“A partir do dia 1º de julho, os brasileiros têm que esquecer o velho cruzeiro e começar a pensar, fazer contas e cálculos apenas em real. Com os computadores, terminais e caixas eletrônicos tem que acontecer a mesma coisa. E tirar o cruzeiro real da memória deles dá um trabalhão”, disse a repórter Graziela Azevedo em reportagem que foi ao ar em 25 de junho de 1994.
E a partir desta segunda-feira (1º), essa história vai ser recontada de um jeito especial em um podcast que vai trazer as batalhas de bastidores, entrevistas com os criadores do real e com brasileiros que viveram as dores e delícias daquela época.
“Eu tive um estresse permanente durante o período que fiquei lá”, afirma Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda.
“Eu nunca mais dormi bem na vida. Imagina botar um negócio desse na rua, como foi dormir. Ninguém passava no antidoping. É uma experiência marcante pessoal, mas eu acho que o encanto da coisa toda suplanta as tensões”, diz o economista Gustavo Franco.
“Os políticos sabiam, já estava na democracia… Os políticos sabiam que quem derrubasse a inflação estava eleito”, afirma o economista Pérsio Arida.
“Ao contrário de outros programas feitos pelos governos anteriores, não estou aqui para anunciar nenhum pacote, nenhum confisco, nenhuma mágica dessas que fazem efeito durante alguns meses e depois trazem de volta a inflação e ainda mais forte”, disse Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Fazenda, em 28 de fevereiro de 1994.
Em entrevistas atuais, o grupo de economistas lembrou que foi preciso apoio político para enfrentar resistências e de parcimônia para explicar com clareza cada etapa a ser cumprida: cortes de gastos públicos, uma espécie de moeda de transição chamada URV e, depois, a chegada da nova moeda, o real.
“Nesse período de transição, nós vamos começar a fazer essas reformas de Estado. E quando essas reformas forem aprovadas e as condições estiverem em andamento, nós, então, entregamos a estabilidade de preço. Havia, sim, a consciência de que era preciso fazer algo diferente”, conta o economista André Lara Resende.
“Eu acho que isso é muito importante: saber que não é um gênio que vai lá e resolve tudo. Não tem salvador da pátria, não tem messianismo salvacionista, não tem atos de voluntarismo explícito que resolvem as coisas. É trabalho duro, com gente competente, que se respeita e que sabe que tem um processo político por trás dessas coisas todas, por definição”, afirma Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda.
O podcast do g1 se chama ‘O Último Plano’ e foi produzido pela equipe de economia do Jornal Nacional em São Paulo
Jornal Nacional/ Reprodução
“A gente passou meses mergulhados nos acervos, e acho que isso é um dos grandes diferenciais do podcast, porque a economia estava em tudo que é lugar. Era uma pauta urgente porque todo mundo vivia em função disso. A hiperinflação mexia com a vida de todas as pessoas, todos os dias”, diz Lucas Paulino, editor do podcast.
O podcast do g1 se chama “O Último Plano” e foi produzido pela equipe de economia do Jornal Nacional em São Paulo. Cada novo episódio ficará disponível às segundas-feiras, quatro no total, que poderão ser ouvidos nos principais tocadores e no site do g1.
“Acho muito importante a gente olhar para essa história para a gente entender do que a gente é capaz. Quando a gente tem um inimigo único, quando a gente tem uma vontade coletiva, do que a gente é capaz. Essa é uma oportunidade de se aproximar de um jeito gostoso, ouvindo histórias de pessoas. Então, eu acho que o resultado ficou muito legal”, afirma Renata Ribeiro.