24 de outubro de 2024

‘Parem a destruição’: Mundano inaugura mural gigante no Centro de SP feito com cinzas de queimadas e lamas de enchente

Obra, com mais de 1.500m², foi produzida com vestígios de desastres que atingiram Amazônia, Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica e RS. Com desenho inspirado na ativista indígena Alessandra Korap, imagem protesta contra Cargill-MacMillan, família de bilionários dos EUA, e a Cargill no Brasil. Em nota, empresa diz respeitar liberdade de expressão e que está acelerando compromisso de eliminar desmatamento. Mural pede o fim do dos crimes ambientais no Brasil
Divulgação
O artista Thiago Mundano, conhecido por seus murais voltados às causas ambientais, inaugurou uma obra no Centro de São Paulo na manhã desta quarta-feira (23). Desta vez, a pintura faz um apelo para o fim dos crimes ambientas no Brasil, em protesto contra a família de bilionários norte-americanos Cargill-MacMillan.
Para a realização do mural, o artista utilizou mais de 100 kg de elementos retirados de desastres brasileiros: cinzas de queimadas na Amazônia, no Cerrado, no Pantanal e na Mata Atlântica; e lama das enchentes no Rio Grande do Sul.
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Mundano contou ao g1 que a obra leva ainda pigmentos naturais de terras indígenas, como argilas e urucum.
O mural, que tem mais de 1.500 m², foi feito em 15 dias e reproduz o rosto da ativista indígena Alessandra Korap, que atua na luta contra o desmatamento e é ganhadora do prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos.
Foto que inspirou o mural
Divulgação/Luan Rentes
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Protesto contra a Cargill
Com os dizeres parem a destruição e mantenham a sua promessa, a obra é um protesto contra a família de bilionários norte-americanos Cargill-MacMillan e a empresa administrada por ela, a Cargill, uma das maiores exportadoras de soja e milho do Brasil e que também atua em outros países.
Segundo Mundano, há uma responsabilidade da companhia diante dos eventos climáticos extremos que o país enfrenta.
O ‘artivismo’ é uma maneira de alertar sobre a emergência climática, o maior desafio da humanidade, afirma Mundano. No Brasil e no mundo sofremos com ondas de calor, secas severas, enchentes causadas pelo desequilíbrio ambiental que grandes corporações como a Cargill estão promovendo. Meu país foi engolido pela fumaça da ganância, destacou.
Cargill-MacMillan quer ser lembrada por ser uma família que acelerou a extinção da humanidade ou por ter sido a família que entendeu a urgência e foi uma das propulsoras para iniciar uma grande mudança global?”
A promessa citada no mural, na verdade, faz referência a dois compromissos que a empresa fez que garantem a diminuição e até mesmo o fim do desmatamento causado pela companhia.
A primeira vez que a Cargill falou sobre o assunto foi em 2014, como consta no site da empresa. O CEO da época, Dave MaCLennan, assumiu um acordo com outras grandes corporações para proteger as florestas em todas as cadeias do suprimento agrícola.
Em 2019, segundo a Reuters, a empresa deixou o acordo por não poder cumprir com o que foi prometido.
Segundo Mundano, em 2021, a empresa se comprometeu novamente com essa meta. Já, a família Cargill-MacMillan teria comentado o assunto e feito uma nova promessa em 2023.
Mundano também cita o Relatório Anual do Desmatamento do MapBiomas como fonte de dados que comprovam a responsabilidade do agronegócio no desmatamento. Em nota, a empresa classifica o relatório como impreciso e que afirmações nele contidas deturpam o trabalho da Cargill.
Mundano chegou a escrever o nome da família na obra, mas, segundo sua assessoria, apagou os dizeres.
No país desde 1965, a Cargill tem sede em São Paulo e conta com unidades industriais em 191 cidades de 17 estados, segundo dados fornecidos pela empresa em seu site.
A trading conta com mais de 8 mil funcionários envolvidos nos negócios de comercialização de commodities agrícolas, produção de ingredientes para indústria alimentícia, desenvolvimento de produtos para o consumo final, serviços financeiros e desenvolvimento de soluções para o segmento industrial.
Em nota enviada ao g1, a Cargill afirmou respeitar a liberdade do artista e diz que já acelerou o seu compromisso de eliminar o desmatamento e a conversão de terras das cadeias de abastecimento direta e indireta de soja, milho, trigo e algodão no Brasil, Argentina e Uruguai até 2025 (leia íntegra abaixo).
Ativistas protestam contra Cargill em frente ao mural do Mundano
Divulgação
Visões dos ativistas
Para Mundano, o mural estar localizado no Centro da capital é parte fundamental da mensagem que ele quer passar.
É de extrema importância estar aqui neste centro financeiro de São Paulo, próximo à Avenida Paulista, deste tamanho, porque São Paulo concentra a maior parte deste capital, de um poder de transformação sistêmica e que causa um impacto tremendo aqui no nosso país, afirma.
Apesar de localizada em uma região com grande visibilidade para os paulistanos, a mensagem do mural está em inglês. Segundo o artista, isso foi pensado para levar a mensagem até a Cargill.
Essa mensagem é escrita em inglês porque ela é direcionada às cooperações internacionais como a Cargill, que têm um impacto gigantesco no Brasil, na América do Sul e no planeta, conta.
É uma mensagem para que eles sejam melhores, que cumpram as promessas que eles mesmos criaram. E acredito que eles podem ser lembrados por terem sido líderes dessa transformação, e isso é algo positivo.
Sobre a escolha de representar Alessandra Korap, Mundano afirma que o fez para celebrar pessoas que ainda estão vivas. A decisão de pintar a figura da Alessandra Korap, foi justamente representar uma pessoa que eu admiro muito e homenagear pessoas vivas. Ativistas que inclusive são ameaçados em nosso país, que é um dos que mais mata ativistas ambientais. Principalmente seus territórios indígenas e no Norte do país, diz.
Então ela, que tem 1,39m, está representada em 1.500m² aqui em São Paulo, mandando uma mensagem para o mundo, finaliza.
Alessandra, por sua vez, vê no mural uma importante ferramenta de luta. É muito significante para todas as lutas que a gente já vem enfrentando, diz. A gente tem uma luta muito grande, tanto de Mundurucu, Caiapó, Kayapó, Panará, quilombolas, ribeirinhos e pescadores.
Ela também se mostra surpresa com o seu tamanho na obra.
Quando falaram ‘Alessandra, vai ser uma imagem’, eu nunca parei para pensar que tamanho que seria. Porque eu sou uma mulher pequena, sou mãe indígena pequena, mas eu sei da força que nós temos.
O que diz a Cargill
A Cargill respeita a liberdade de expressão do artista. Dito isto, cabe esclarecer que o mural baseia-se em relatório que é impreciso e as afirmações nele contidas deturpam o trabalho da Cargill e as nossas cadeias de abastecimento.
O fato é que a Cargill acelerou o seu compromisso de eliminar o desmatamento e a conversão de terras das nossas cadeias de abastecimento direta e indireta de soja, milho, trigo e algodão no Brasil, Argentina e Uruguai até 2025. Estamos no caminho certo para cumprir esse compromisso.
Continuamos inabaláveis ​​nas nossas ações para proteger os direitos humanos, aumentar a sustentabilidade e proporcionar cadeias de abastecimento livres de desmatamento.
Confira mais fotos do processo de separação do material e de pintura da obra:
Artistas produzem tinta com material retirado das enchnetes do Rio Grande do Sul
Divulgação/Luan Rentes
Artistas produzem tinta com material retirado das enchnetes do Rio Grande do Sul
Divulgação/Luan Rentes
Pintura do Mural de Mundano
Divulgação/Luan Rentes
Pintura do Mural de Mundano
Divulgação/Luan Rentes
*Sob supervisão de Cíntia Acayaba

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