Discussão foi reacesa nesta semana após decisão da Meta de acabar com a checagem de fatos em suas redes. Câmara chegou a criar grupo de trabalho para debater o projeto, mas nunca avançou. A oposição na Câmara dos Deputados tem se dividido a respeito de qual estratégia tomar projeto de regulação das redes, parado há quase dois anos. Por um lado, há quem defenda o avanço da proposta para evitar que o Supremo Tribunal Federal (STF) tome a frente e endureça as regras antes da análise do Legislativo; por outro, parlamentares preferem enterrar de vez a matéria.
Nesta semana, a Meta, dona do Instagram e do Facebook, anunciou o fim do sistema de checagem de fatos nos EUA. A decisão reacendeu a discussão sobre a regulação das redes no Brasil.
Um grupo de trabalho chegou a ser criado pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), para discutir a proposta, mas foi extinto sem se reunir uma única vez.
Em resumo, o texto estabelece punições para a divulgação de conteúdos falsos por meio de contas automatizadas e prevê a responsabilização das plataformas digitais por negligência no combate à desinformação.
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Deputados da oposição, contrários à regulação das redes, apresentaram visões diferentes sobre qual estratégia adotar. Um dos caminhos seria enterrar o projeto de vez, sem pautá-lo para votação no plenário.
“Eu acredito que não discutir sobre algo também é legislar. O parlamento entende que o que está aí é suficiente. Não precisamos nos curvar à vontade de alguns juízes que acham que tem o poder de dizer o que temos e o que não temos que discutir”, afirmou o deputado Maurício Marcon (PODE-RS), que integrou o grupo de trabalho criado por Lira.
Vice-presidente da Câmara, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) afirmou que votar o projeto é uma forma de apoiar a “censura” e que o STF deve arcar com ônus da decisão.
“Nunca vamos apoiar a censura! Se o STF acha que eles são legisladores e querem usar dessa competência na nossa “democracia relativa” eles que o façam”.
Já o deputado Rodrigo Valadares (União-SE), que também integrou o colegiado, defendeu que o grupo inicie seus trabalhos para elaborar uma proposta e, dessa forma, evitar que o STF dê uma definição própria para o tema, já que há um julgamento em curso na Corte sobre esse assunto.
Na visão do parlamentar, é melhor a Câmara produzir sua própria regulação do que esperar uma do STF, com a qual os deputados provavelmente discordarão, das as divergências que têm com a Corte.
“Eu não diria que a decisão da Meta enterra a regulação das redes sociais no Brasil, mas caso tenha que acontecer deverá ser feita pela Câmara dos Deputados, pelo Congresso Nacional, e não pelo Judiciário”, afirma.
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Apoio do governo
Depois da decisão da Meta, o presidente Lula criticou as medidas e afirmou que os países devem ter suas soberanias “resguardadas”.
Nesta sexta (10), o presidente reuniu ministros no Planalto para discutir a questão. Após o encontro, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, disse que o governo vai dialogar com o Congresso Nacional.
“Quem cabe votar e tramitar arcabouço legal é o Legislativo. Se o Legislativo entender que é melhor, mais rápido, nós enviaremos um projeto [de autoria do Executivo]”, disse o ministro a jornalistas. “Nós vamos procurar os líderes e os presidentes das duas Casas para dialogar sobre qual é o melhor formato, qual é a melhor forma de fazer com que esse debate avance.”
Mas governistas que defendem a medida no Congresso dizem que, até então, não houve engajamento do governo na aprovação da proposta.
“Essa agenda só evolui se houver interesse e mobilização do comando da Câmara e esforço decidido do governo. Juntos”, disse Orlando Silva (PCdoB-SP), antigo relator da proposta.
Já o deputado Jilmar Tatto (PT-SP), que também integra o grupo de trabalho sobre o projeto, negou que o tema tenha que ser bandeira do governo e disse que “é pauta do Congresso”.
O parlamentar afirma que procurou “informalmente” o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), que deve se tornar o próximo presidente da Câmara, para tratar da proposta.
Histórico
O PL da regulação das redes foi apresentado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania) e aprovado no Senado em junho de 2020. Em julho do mesmo ano chegou à Câmara. Na Casa, o texto foi discutido em um grupo de trabalho finalizado em dezembro de 2021.
O relator, deputado Orlando Silva (PCDoB), apresentou seu último parecer em abril de 2023, mesmo mês em que o plenário aprovou a urgência para o projeto, no dia 23.
Em 2 de maio de 2023, quando a proposta seria votada no plenário, Silva pediu a retirada de pauta do projeto, porque não havia segurança de que a matéria seria aprovada. O projeto não voltou mais à pauta.
Responsabilidade das redes
O STF também analisa a responsabilidade das redes sociais pelos conteúdos publicados pelos usuários.
Na prática, a Corte vai definir em que circunstâncias as big techs podem responder por danos de postagens dos cadastrados em suas plataformas.
A discussão envolve um ponto do Marco Civil da Internet — a lei de 2014 que funciona como uma espécie de Constituição para o uso da rede no Brasil, ao estabelecer princípios, garantias, direitos e deveres para usuários e empresas.