19 de setembro de 2024

‘Pode ir na ONU, na Liga da Justiça, no raio que o parta, que não tô nem aí’, diz Tarcísio sobre denúncias de irregularidades da PM em operação no litoral de SP

Governador diz que polícia paulista é profissional e que vai investigar excessos após denúncia de que corpos de mortos na Operação Verão da PM são levados como vivos a hospitais para evitar perícia. Na quinta (7), Ministério Público abriu investigação sobre o caso. Governador Tarcísio de Freitas sobre denúncias da Operação Verão: ‘Tô nem aí’
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), disse nesta sexta-feira (8) que a Operação Verão está sendo feita com profissionalismo e inteligência e minimizou as denúncias de funcionários da Saúde de Santos de que corpos de mortos na Operação Verão da PM na Baixada Santista são levados como vivos para hospitais para evitar perícia.
“Sinceramente, nós temos muita tranquilidade com o que está sendo feito. E aí o pessoal pode ir na ONU, pode ir na Liga da Justiça, no raio que o parta, que eu não tô nem aí”, disse o governador.
Ele afirmou, entretanto, que o estado irá investigar.
“Tem uma questão de denúncia, vamos investigar. Agora, nós precisamos de fato saber o que realmente aconteceu. Não há nenhum interesse da nossa parte em confrontar ninguém. Nós tínhamos lá na baixada uma série de barricadas que foram removidas. Locais em que o poder público não entrava. Hoje a gente retirou todas as barricadas. A gente está restabelecendo a ordem. Não existe progresso sem ordem.”
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O governador foi questionado sobre o tema após agenda na capital para divulgar um pacote de ações voltado às mulheres.
Durante a coletiva de imprensa, Tarcísio ainda negou que o governo tenha recebido denúncias de irregularidades e defendeu a operação.
“Nossa polícia é extremamente profissional (…) A gente está fazendo o que é correto.”
Os relatos foram revelados pelo g1 e pela TV Globo na quarta-feira (6).
No dia seguinte, na quinta (7), o Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial (Gaesp), do Ministério Público de São Paulo, abriu uma notícia de fato para investigar o caso.
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Trabalho do MP
Os promotores vão colher os prontuários médicos e identificar os socorristas para saber como esses transportes ocorreram.
O Gaesp também oficiou a Secretaria de Santos para saber se sindicância interna foi instaurada, como afirmaram ao g1, e a Corregedoria da PM.
Quando o corpo é retirado do local do crime, o trabalho da perícia fica prejudicado, e é difícil constatar, por exemplo, se houve um homicídio ou uma Morte Decorrente de Intervenção Policial (MDIP) — quando alguém é baleado em confronto com a polícia, segundo especialistas em segurança pública ouvidos pelo g1.
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De acordo com promotores e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a retirada dos corpos, se for confirmada, pode ser enquadrada como crime de fraude processual. A pena prevista na lei é de três meses a dois anos de detenção, e multa.
Para a reportagem, o g1 teve acesso, com exclusividade, a dez boletins de ocorrência que se referem a 17 das 39 mortes ocorridas durante a operação da PM.
Nos dez registros, a polícia alega que os mortos eram criminosos e que foram baleados por estarem armados. No caso de 12 pessoas mortas, há a informação de que elas foram socorridas e levadas com vida ao pronto-socorro, onde teriam morrido.
Com pequenas variações, a informação presente nos boletins obtidos pelo g1 é a seguinte: “Os policiais foram recebidos a tiros e houve confronto. Um suspeito foi atingido e levado ao Pronto-Socorro, mas não resistiu”.
Relatos de funcionários do sistema de saúde de Santos, no entanto, diferem do que está escrito nos boletins.
O porta-voz da PM de São Paulo, Émerson Massera, afirmou, em entrevista ao g1 e à TV Globo, que as denúncias e os diálogos com os socorristas serão analisados.
“As notícias que foram relatadas, que foram trazidas, vão ser analisadas, os diálogos com socorristas. Para que a gente consiga identificar as causas e identificar os motivos e se houver necessidade de adotar providências pelos fatos que já ocorreram serão adotados”, disse.
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“A perícia num local de crime é fundamental para a resposta, até no sentido de responsabilizar quem cometeu aquele crime. Uma violação de local de crime acaba atrapalhando toda a cadeia de provas. Isso é péssimo para a Polícia Militar, para o sistema de Justiça. Isso é péssimo para manter o local de crime preservar o local de crime de modo que a perícia consiga fazer o seu trabalho é fundamental para o ciclo de polícia e para o ciclo também de percepção criminal. Então, nossa preocupação é grande, é um problema que nós refutamos da máxima gravidade e temos o máximo interesse também em fazer com que o local continue sendo preservado, até que a perícia faça todo o seu trabalho”, completou.
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Pedido à ONU para encerrar operação
A Defensoria Pública de São Paulo, em conjunto com a Conectas Direitos Humanos e o Instituto Vladimir Herzog, pediu à ONU, no último dia 16, o fim da operação e a obrigatoriedade do uso de câmeras corporais pelos policiais militares. Segundo o órgão, as câmeras não foram utilizadas em nenhuma das ocorrências analisadas.
De acordo com o documento enviado à ONU, há “indícios da não preservação das cenas dos crimes, bem como a repetição da versão policial em todas as ocorrências com morte: que os suspeitos portavam drogas, atiraram e que teriam sido socorridos ainda com vida. Nesse contexto, a ausência de corpos nas cenas de crimes impossibilitaria que a perícia coletasse provas técnicas”.
Operação Verão
A Operação Verão acontece todos os anos nas cidades litorâneas paulistas para prevenir a criminalidade durante os meses em que as praias da região ficam lotadas de turistas. Desta vez, começou em 18 de dezembro.
Até março, a polícia prendeu 825 pessoas e apreendeu 580 quilos de drogas, números semelhantes aos que ocorreram em 2023, 2022 e 2021. Diferentemente dos anos anteriores da operação, em que ninguém morreu, desta vez, 39 pessoas foram mortas.
Não há previsão de a Operação Verão acabar.

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