Tribunal entrou no recesso de meio de ano. Entre os casos dos últimos meses, também se destacou a decisão que vai impactar na revisão da vida toda do INSS. Fachada do Supremo Tribunal Federal
Gustavo Moreno/SCO/STF
O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou, ao longo do primeiro semestre de 2024, uma série de processos com repercussão econômica, política e social, reconhecendo direitos e determinando ao governo a adoção de providências.
A Corte analisou, por exemplo, o porte de maconha para consumo próprio, a correção dos depósitos do FGTS, a validade das sobras eleitorais, o regime de casamento de pessoas com mais de 70 anos.
Na primeira parte de 2024, o tribunal tomou mais de 52 mil decisões. Dentre estas, pouco mais de 10 mil foram colegiadas (decisões coletivas no plenário e nas turmas).
No mesmo período, o Supremo recebeu 37,6 mil processos. Por outro lado, também nestes últimos meses, 39,2 mil processos foram encerrados.
O tribunal estará em recesso em julho e retoma suas atividades no dia 1º de agosto.
Veja abaixo o que de mais importante foi analisado no semestre que passou.
Porte de maconha para consumo individual
No dia 26, na última sessão do semestre, o Supremo concluiu o julgamento do recurso que discutia se é crime o porte de maconha para consumo individual. Por maioria, a Corte entendeu que a conduta não é crime, mas um ato ilícito administrativo. Os ministros fixaram uma orientação para a aplicação da decisão, e estabeleceram que o porte de até 40g da substância ou seis plantas fêmeas não é uma infração penal.
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Correção dos depósitos do FGTS
Ainda em junho, os ministros decidiram que a correção do saldo do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) precisa garantir, no mínimo, a compensação da inflação – ou seja, o percentual do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A decisão terá efeitos sobre os depósitos feitos após o julgamento.
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Uso de banheiro por pessoas trans
O último mês do semestre do Supremo também teve o julgamento do recurso que discutia se uma pessoa transexual pode usar banheiros conforme sua identidade de gênero. Ou seja, como se percebem (homem ou mulher), independentemente do sexo a que pertencem. Os ministros consideraram que o tema não tinha questão constitucional a ser analisada. Por isso, decidiram não votar o caso. Na prática, o mérito acabou não sendo deliberado.
Cotas raciais em concursos públicos
Em julgamento virtual, também em junho, o Supremo decidiu pela prorrogação da validade das cotas raciais em concursos públicos. Os ministros estenderam a vigência da Lei de Cotas até que o Congresso Nacional aprove uma nova lei sobre o tema.
Desqualificação de mulheres vítimas de violência
Em maio, o STF invalidou a prática de desqualificar e culpar as mulheres vítimas de violência quando ocorre o julgamento destes crimes na Justiça. Com isso, estabeleceu que o uso deste tipo de argumento em processos por crimes de violência contra a mulher pode anular os julgamentos.
Indicações políticas em estatais
Ainda em maio, o Supremo considerou que está de acordo com a Constituição a restrição à indicação de políticos e autoridades de governo para o comando das estatais. A Corte decidiu manter válidas as indicações que foram feitas enquanto estava em vigor a decisão que suspendeu a aplicação da lei, tomada em março do ano passado. Na prática, isso permitiu manter as nomeações feitas a partir do governo Lula.
Indenização por bala perdida
Em abril, o plenário concluiu o julgamento sobre o dever do Estado de indenizar famílias de vítimas de tiroteios em operações policiais. Os ministros fixaram as situações em que o Poder Público terá de ressarcir as famílias pelos danos. Pela decisão, os governos devem se responsabilizar quando há mortos e feridos em incursão de agentes de segurança pública. Mas isso não ocorrerá se os governos demonstrarem que não houve participação direta de policiais na morte e nos ferimentos das vítimas. Neste ponto, não servirá como prova, por si só, uma perícia que não conclua sobre a origem do tiro.
Forças Armadas não são poder moderador
Também em abril, o tribunal estabeleceu que as Forças Armadas não têm poder constitucional para uma intervenção militar – nem para atuar como poder moderador. Os ministros fixaram que a chefia Forças Armadas é um poder limitado e não pode ser utilizado para indevidas intromissões no funcionamento independente dos outros Poderes.
Abordagem policial discriminatória
No mesmo mês, o STF decidiu que a busca pessoal em suspeitos, ou seja, a revista feita por policiais, não pode ter como base a “raça, sexo, orientação sexual, cor da pele, ou aparência física”. Os ministros concluíram que os agentes devem realizar o procedimento se houver indícios de irregularidades – por exemplo, a posse de uma arma proibida.
Uso de trajes religiosos em fotos
Em mais um julgamento de abril, a Corte definiu que é possível o uso de trajes religiosos em fotos de documentos oficiais como a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), por exemplo.
Poder de investigação do Ministério Público
Entre abril e maio, o Supremo concluiu que as investigações do Ministério Público (MP) precisam seguir os mesmos prazos e parâmetros dos inquéritos policiais. Além disso, voltou a afirmar que o MP tem poder de investigação e não há monopólio das polícias nas investigações.
Pauta ambiental
Em março, o tribunal decidiu que o governo deve tomar uma série de providências na proteção ao meio ambiente na Amazônia. Entre elas, combater o desmatamento. O tribunal entendeu que as ações do governo federal no setor estão voltando a se alinhar com a proteção da flora e fauna prevista na Constituição – este processo foi chamado de “reconstitucionalização”. Mas consideraram que isso ainda não está concluído.
Licença-maternidade para casal homoafetivo
Em outro julgamento de março, o Supremo fixou que a mãe não gestante em união homoafetiva tem direito à licença-maternidade. O benefício vai valer para trabalhadoras do serviço público e da iniciativa privada. Além disso, se uma das mulheres obtiver a licença-maternidade, a outra terá um benefício equivalente ao período da licença-paternidade.
Decisão com impacto na ‘revisão da vida toda’
Também em março, o plenário tomou uma decisão que pode inviabilizar o julgamento que a Corte fará sobre a “revisão da vida toda” do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Isso ocorreu porque os ministros entenderam que os segurados não podem optar entre regras de transição no cálculo de benefícios, mesmo que estejam escolhendo a mais vantajosa. A tese da revisão da vida toda defende justamente a possibilidade de optar pelo recálculo da aposentadoria.
Sobras eleitorais
Em fevereiro deste ano, o STF anulou as regras aprovadas pelo Congresso Nacional de distribuição das chamadas sobras eleitorais, vagas não preenchidas na eleição para deputados e senadores. Na ocasião, ficou acertado que o entendimento vai valer para as eleições a partir de 2024. No entanto, em junho, a Corte começou a analisar um recurso à decisão, que pede que a anulação seja aplicada ao resultado das urnas para deputado federal em 2022. Já há maioria para a aplicação retroativa, mas o julgamento do recurso ainda não terminou.
Casamento de pessoas mais de 70 anos
No começo do ano do Judiciário, o plenário votou para derrubar uma regra do Código Civil que tornava obrigatória a aplicação do regime de separação de bens em casamento e união estável de pessoas com mais de 70 anos. Na prática, pela decisão do tribunal, separação de bens passou a ser facultativa, só aplicável quando não for manifestada a vontade dos noivos. Quem for se casar ou celebrar união estável e estiver nesta idade poderá escolher livremente o modelo patrimonial para a união.