Trabalhadores temem agressões e também que sejam obrigados a arcar com multas se estiverem dirigindo e alguém subir no teto do coletivo em movimento. Jovens surfam em ônibus em movimento na rodovia BR-101 no Grande Recife
Reprodução/WhatsApp
A aprovação de um projeto de lei que proíbe o “surfe rodoviário”, também conhecido em Pernambuco como “morcegar” em ônibus, está causando polêmica entre os trabalhadores do transporte público do Grande Recife. De acordo com o Sindicato dos Rodoviários, o texto coloca sob responsabilidade dos motoristas e cobradores a função de retirar as pessoas que circulam em cima dos ônibus ou do lado de fora de portas e janelas dos veículos em movimento.
O Projeto de Lei 1366/2023, de autoria do deputado estadual Júnior Tércio (PP), foi aprovado pela Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) e seguiu para sanção da governadora Raquel Lyra (PSDB).
✅ Receba no WhatsApp as notícias do g1 PE
Segundo o presidente da entidade sindical, Aldo Lima, os rodoviários temem que a categoria seja posta em risco ao abordar os contraventores e também que os trabalhadores estejam sujeitos a pagar as multas de trânsito se estiverem dirigindo e alguém descumprir a norma.
“Temos desacordos com alguns termos. O projeto foi aprovado sem consultar a categoria, nem os usuários, nem os estudantes, nem os trabalhadores. Foi aprovado no período das eleições municipais e no último fim de semana foi encaminhado para a sanção da governadora sem ouvir a sociedade”, questionou o representante sindical.
A insegurança sobre a nova lei fez o sindicato realizar um protesto no final da manhã de segunda-feira (4), no Centro da capital pernambucana, pedindo que a governadora vete a proposta. Das 11h às 13h, vários ônibus ficaram parados na Rua do Sol, no bairro de Santo Antônio, bloqueando o trânsito na região.
Rodoviários realizaram protesto no Centro do Recife contra trechos de projeto de lei sobre ‘surfe rodoviário’
Reprodução/TV Globo
Também na tarde da segunda, em pronunciamento no plenário da Alepe, durante a votação da lei que dá acesso gratuito a medicamentos à base de maconha, o deputado estadual Júnior Tércio disse que o texto está sendo mal interpretado.
“O projeto diz que o motorista, ao perceber que há um marginal surfando, deve avisar às autoridades e parar o veículo em local seguro. Caso isso não aconteça, quem será punido é a empresa ou o meliante. Não é justo punir as partes mais frágeis do processo, o motorista e o cidadão. Gostaria de deixar bem claro: essa Casa não ia aprovar algo ruim para a sociedade, um peso maior para os trabalhadores. A lei é uma normal geral, os termos específicos serão tomados pelo Executivo por meio de atos. Por isso, digo aos motoristas: leiam a lei”, disse o parlamentar.
O que diz o projeto
O texto do PL proíbe a prática nos veículos do Sistema de Transporte Público de Passageiros do Grande Recife e do Sistema de Transporte Coletivo Intermunicipal de Passageiros do Estado de Pernambuco.
A matéria define como surfe ou “morcegamento” permanecer ou transitar do lado externo do transporte público, em locais como portas, janelas e teto dos ônibus, com o veículo em movimento, colocando em risco a segurança da própria pessoa e dos demais usuários do transporte e da coletividade.
O texto aprovado prevê que em caso de surfe rodoviário:
Cabe ao motorista ou outro responsável pelo ônibus solicitar imediatamente que o usuário interrompa a ação e, em caso de negativa, chamar a polícia para retirar a(s) pessoa(s);
Se, após a advertência para interromper o surfe ou “morcegamento”, a determinação não for atendida, quem estiver se transportando de forma irregular fica sujeito a pagar multa com valor entre 10 e 100 vezes a tarifa de transporte aplicável na linha em que o fato aconteceu;
Proíbe a movimentação do ônibus enquanto alguém estiver descumprindo a lei e, no caso de o motorista guiar um veículo com pessoas “morcegando”, a empresa concessionária de transporte pode pagar multa e sofrer outras punições.
“O motorista não tem culpa da insegurança no transporte público. Em dia de clássico, por exemplo, ou em dia de praia – que é quando as pessoas mais ‘morcegam’ os ônibus. Às vezes tem mais de 10, até 15 pessoas morcegando no mesmo ônibus (…), o motorista vai parar o veículo no meio do caminho e mandar o povo descer? Corre o risco de ser agredido e os passageiros também serem agredidos. Daqui para que ele [o motorista] pare, chame a polícia e a polícia chegue, muita coisa pode acontecer, colocando em risco os trabalhadores e os usuários”, argumentou Aldo Lima.
Outra questão levantada pelo sindicato é que motoristas e cobradores sejam obrigados a arcar com as possíveis multas.
“Temos receio de que os trabalhadores sejam prejudicados também nesse sentido. As multas vão para as empresas, mas os trabalhadores é que vão ter que avaliar se dá ou não para parar o ônibus; que vão estar em risco na hora de falar com quem morcega os ônibus. A gente vai aguardar o governo vetar o projeto. Vamos mandar um ofício para a governadora pedindo para que ela vete o projeto da forma como se encontra agora”, completou o presidente do Sindicato dos Rodoviários.
LEIA TAMBÉM
Adolescente de 14 anos morre após ‘surfar’ no teto de ônibus em movimento
O deputado Júnior Tércio, em entrevista à TV Globo, disse que o motorista só deve parar o ônibus “quando se sentir seguro”. “Vamos para um caso prático: quando vier uma viatura, quando estiver passando na frente de uma delegacia. Diante desse imbróglio todo, jamais será punido o motorista ou a população”, argumentou o parlamentar.
Para o deputado, está claro no projeto de lei que a punição é para quem praticar o surfe rodoviário e para as empresas de ônibus, sem prejuízo para os trabalhadores e para a população.
“Nós trazemos o debate para a empresa, porque quem ganha é a empresa. E também trazer para a discussão a segurança pública. A gente só não pode colocar aí no meio o motorista e a população, como os mais frágeis da situação. O poder público precisa dar uma resposta. Quando falamos do objetivo principal da lei, estamos falando em preservar vidas. Recentemente, no começo do ano, tivemos um caso em São Lourenço da Mata: um jovem de 14 anos perdeu a sua vida. Estamos preservando vidas e chamando à responsabilidade a empresa”, falou Tércio.
Deputado estadual Júnior Tércio (PP) explica projeto de lei que pune surfe rodoviário
VÍDEOS: mais vistos de Pernambuco nos últimos 7 dias