25 de dezembro de 2024

Quase 20 anos depois de menino morrer vítima de incêndio, Justiça condena empresas a descontaminarem terreno

Área era utilizada para descartar resíduos perigosos da CSN e Saint-Goban. Caso aconteceu em 2004, em Barra Mansa. João Pedro Teodoro da Silva, de 8 anos, teve 50% do corpo queimado e morreu após ficar quase 2 meses internado. João Pedro Teodoro da Silva, de 8 anos, vítima de incêndio em 2004
Arquivo TV Rio Sul
Quase 20 anos depois da morte de um menino, de 8 anos, vítima de graves queimaduras causadas por um incêndio em um terreno utilizado para descarte de resíduos perigosos em Barra Mansa (RJ), a Justiça Federal condenou a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a Saint-Gobain e a empresa proprietária da área a descontaminarem e recuperarem o local (leia mais no final da reportagem).
A sentença foi decretada a partir de uma ação civil pública ajuizada pela Ministério Público Federal (MPF). A decisão foi divulgada nesta terça-feira (30).
Segundo o MPF, o terreno particular era alugado para empresas que recebiam e tratavam resíduos da CSN e da Saint-Gobain, como finos de carvão, coque e sulfato de manganês. Esses materiais eram vendidos para olarias da região.
Na época, um laudo da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema), órgão de controle ambiental da Secretaria de Estado do Ambiente e Desenvolvimento Urbano do Estado do Rio de Janeiro, apontou que o produto encontrado no local era carvão vegetal, material orgânico que causa a combustão espontânea.
O fenômeno é chamado de fogo de turfa, um tipo de incêndio que pode acontecer abaixo da superfície.
Incêndio em terreno com resíduos perigosos em Barra Mansa em 2004
Arquivo TV Rio Sul
Relembre o caso
O caso aconteceu no dia 3 de julho de 2004 e causou uma grande repercussão na região. João Pedro Teodoro da Silva e dois primos, de 11 e 12 anos, estavam jogando futebol perto de casa quando a bola caiu dentro do terreno. A área fica às margens do Rio Paraíba do Sul, na Avenida Presidente Kennedy, no bairro Getúlio Vargas.
João Pedro foi pegar a bola e acabou queimando os pés, pernas e outras partes do corpo. Os dois primos foram ajudá-lo e também queimaram os pés.
Relatos da época apontam que o fogo surgiu direto do solo. Bastava jogar uma pedra ou pisar com força para que as labaredas aparecessem.
Incêndio em terreno com resíduos perigosos em Barra Mansa em 2004
Arquivo TV Rio Sul
Os primos de João Pedro foram levados para a Santa Casa e liberados.
Já o menino, de acordo com autoridades da época, teve 50% do corpo queimado. Ele foi encaminhado à Santa Casa e, três dias depois, diante da gravidade, precisou ser transferido para o Centro de Tratamento de Queimados do Hospital das Clínicas, em São Paulo (SP).
João Pedro passou por diversas cirurgias, que incluíram a amputação de alguns membros. Depois de quase dois meses de internação, no dia 19 de agosto, ele sofreu uma parada cardíaca quando um novo enxerto de pele estava sendo feito e morreu.
Solo e rio contaminados
Incêndio em terreno com resíduos perigosos em Barra Mansa
Arquivo TV Rio Sul
De acordo com o MPF, o terreno foi utilizado por uma empresa entre 1985 e 1999. Em 2002, a proprietária o alugou para uma outra empresa, que ocupou a área até 2003.
Logo em seguida, o terreno ficou vazio. Neste tempo, conforme o MPF, não foi feita qualquer ação para recuperação ou descontaminação da área, tampouco foi criada uma barreira para impedir a entrada de pessoas não autorizadas.
“A consequência disso foi a contaminação do solo e da água – o terreno está na faixa marginal de proteção do Rio Paraíba do Sul –, e um acidente, em 2004, quando meninos entraram no terreno e sofreram queimaduras que acabaram causando a morte de um deles”, afirmou o MPF.
Sentença
A Justiça determinou que a proprietária do terreno, a CSN e a Saint-Goban deverão “dar a destinação adequada aos resíduos industriais porventura existentes”.
A proprietária terá, ainda, que “remover as edificações que estejam na faixa marginal de proteção do Rio Paraíba do Sul” e “não poderá usar o terreno para outros fins, enquanto estiver em execução o processo de recuperação”.
Também foi determinado que o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) “acompanhe o cumprimento da sentença, adotando as providências necessárias para a verificação da conformidade dos relatórios e das medidas de intervenção implementadas para a recuperação da área degradada”.
O que dizem os citados?
CSN
Procurada pelo g1, a companhia informou que “não há relação entre as atividades exercidas pela CSN e o processo de deterioração ambiental verificado no imóvel” e que “não há um documento que comprove que o material depositado na área seja proveniente da Usina Presidente Vargas”.
Disse também “que parte significativa da lama de alto-forno e pó coletor era reciclada internamente na UPV, enquanto que o excedente era destinado [a uma outra empresa]”.
Inea
Ao g1, o instituto disse ficou sabendo da decisão judicial nesta terça-feira “e que irá tomar as devidas providências para o cumprimento da mesma”.
Saint-Gobain
Em nota, a empresa disse que “foi notificada recentemente sobre a decisão e está analisando o tema para se posicionar”.
O g1 não conseguiu contato com as outras partes citadas nesta reportagem: Vera Lúcia Guimarães Almeida dos Santos, Reciclam e Cesari Empresa Multimodal de Movimentação de Materiais.
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