11 de janeiro de 2025

‘Saidinhas temporárias’: em 3 anos, 338 presos da região não voltaram para penitenciárias; veja dados

Proposta que acaba com benefício em feriados e datas comemorativas foi aprovada no Senado e na Câmara. Benefício é ferramenta para ressocialização e está previsto em lei. Penitenciárias de Araraquara e Itirapina concedem saidinha temporária para presos
Arquivo/EPTV e g1
‘Saidinha de presos’: você sabe como funciona? O tema está em alta desde que o proposta que acaba com a saída temporária em feriados e datas comemorativas foi aprovada no Senado e na Câmara dos Deputados.
Em três anos, 338 presos não retornaram para as penitenciárias e centros de ressocialização de Araraquara (SP), Itirapina, Mococa e Rio Claro, em 13 saidinhas.
O número representa 2,57% do total de beneficiados. O levantamento foi feito pelo g1 com base em dados da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP). (veja abaixo a tabela).
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Na semana passada, um detento de 36 anos que estava em liberdade por conta da saidinha de Páscoa foi preso em São João da Boa Vista (SP) depois de roubar a matar uma garota de programa. Ele tinha conseguido o benefício do semiaberto em fevereiro deste ano.
A saída temporária é uma ferramenta para ressocialização dos presos e está prevista em lei. (Entenda mais abaixo como funciona).
Detentos durante saidinha de fim de ano em penitenciária
André Modesto/TV TEM
Na região de cobertura do g1 São Carlos e Araraquara, há unidades prisionais nos seguintes municípios:
PENITENCIÁRIAS: Araraquara, Casa Branca e Itirapina
CENTRO DE DETENÇÃO PROVISÓRIA: Aguaí
CENTRO DE RESSOCIALIZAÇÃO: Araraquara (masculino e feminino), Mococa e Rio Claro (masculino e feminino)
Dentro de algumas dessas unidades há Ala de Regime Semiaberto (ARSA), Anexo de Detenção Provisória (ADP), Ala de Progressão Penitenciária (APP) e Prisão Civil (PC) que é prisão por dívida/inadimplência por pensão alimentícia.
Porém, tem direito ao benefício da saidinha somente os detentos em Araraquara, Itirapina, Mococa e Rio Claro. Os presos em Casa Branca estão em regime 100% fechado e os de Aguaí não tem direito porque ainda aguardam julgamento.
Veja como foram as últimas saidinhas na região:

*Caso não esteja visualizando os números de foragidos, passe o mouse ou clique na área em vermelho.
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A capacidade prisional das unidades na região é de 6.156 e o total de presos até esta quarta-feira (20) é de 8.268. Uma superlotação de 34,3%.
O que são as saídas temporárias e como funcionam?
As saídas temporárias em datas comemorativas e feriadas – conhecidas como saidinhas ou saidões de Natal, Dia das Mães etc. – são um benefício que costuma ser concedido aos presos do regime semiaberto pela Justiça com base na Lei de Execuções Penais.
O benefício só é concedido aos detentos que:
Tenham bom comportamento;
Não tenham praticado faltas graves no último ano;
Tenham cumprido parte da pena (1⁄6 para réus que estão cumprindo a 1ª condenação, e 1⁄4 para reincidentes).
Além disso, as unidades prisionais precisam avaliar se a saída cumpre os objetivos da pena da pessoa. A partir desses dados, o Ministério Público emite um parecer favorável ou contrário à saída temporária e o juiz ou a juíza da Vara de Execuções Penais decidem se concedem ou não o benefício.
A legislação atual permite que juízes autorizem as “saidinhas” a detentos do regime semiaberto para:
visitas à família
cursos profissionalizantes, de ensino médio e de ensino superior
e atividades de retorno do convívio social
Com as mudanças do pacote anticrime, em 2020, o preso condenado por crime hediondo com morte não tem mais direito a saída temporária, a não ser que tenha obtido o benefício antes da mudança da lei.
Em regra, a saidinha em datas festivas dura 7 dias e pode ser concedida 4 vezes no ano, com intervalo de 45 dias entre elas.
Os presos são proibidos de frequentar bares e casas noturnas —independente da hora— e devem ficar durante toda a noite no endereço informado à Justiça.
O benefício é revogado caso o preso cometa algum crime ou deixe de cumprir alguma das regras da saída.
Relembre o caso do detento em ‘saidinha’ que matou garota de programa:
Corpo de mulher vítima de latrocínio em São João da Boa Vista é enterrado neste sábado
Câmara aprova fim das saidinhas
A Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira (20) o projeto de lei que acaba com as “saidinhas” de presos em feriados. O texto segue para sanção presidencial.
O relator da proposta é o deputado Guilherme Derrite (PL-SP). Ele se licenciou do cargo de Secretário de Segurança Pública do estado de São Paulo, no governo Tarcísio de Freitas, apenas para atuar na aprovação da pauta. Após a votação do projeto, ele retornará ao cargo como secretário.
A discussão no Congresso sobre restrições às saídas temporárias começou em 2013, mas ganhou força após o policial militar Roger Dias ser morto por um preso beneficiado pela saidinha em Belo Horizonte, em janeiro.
No senado, o relator do projeto, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), sugeriu inclusive que a lei a ser criada pelo projeto fosse nomeada “Sargento PM Dias”. Welbert Fagundes, acusado de matar o PM, foi preso novamente e cumpre agora a pena em regime fechado.
Segundo levantamento realizado pelo g1, a saída temporária de Natal de 2023 – a mais recente concedida – beneficiou pouco mais de 52 mil presos. Desses, 95% (49 mil) voltaram às cadeias dentro período estipulado. Os outros 5% (pouco mais de 2,6 mil), não.
Saidinha de Natal beneficiou 52 mil presos; 49 mil retornaram e 2,6 mil, não
Projeto não tem apoio do governo Lula
O projeto não teve o apoio do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O presidente já disse a interlocutores ser contrário ao fim do benefício, mas ainda vai avaliar o texto final para checar se vai sancioná-lo ou vetá-lo, segundo informou Valdo Cruz, comentarista de política e economia da GloboNews, nesta quarta (20).
A disposição inicial no governo era para defender o veto, mas o contexto político atual pode pesar, principalmente por ser um tema, o da segurança, que está em destaque na avaliação dos eleitores e tem desgastado a imagem do presidente Lula.
O relator da projeto de lei no Senado, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), diz que benefícios como esse têm colocado a “população em risco”. Além disso, as instalações carcerárias brasileiras não têm cumprido o papel de ressocializar os presos.
O que dizem especialistas?
Para o advogado Felippe Angeli, a ausência de ações e políticas voltadas aos presos facilita o recrutamento desses detentos por facções criminosas.
“Acaba se tornando um grande auxílio às facções” ponderou ao g1 em fevereiro. “Vão sair sem a menor chance de se reintegrar na sociedade, conseguir interromper seu percurso criminal, obter independência financeira, ter autonomia no seu percurso fora do cárcere”, afirmou .
Angeli — que representa o centro de pesquisa Justa — lembrou ainda que o benefício é concedido a presos que se aproximam do fim da pena como forma de retomarem contato com a comunidade, com familiares e locais de origem afetiva.
O advogado criminal Conrado Gontijo vê o projeto como punitivo. Segundo ele, a proposta penaliza os presos que respeitam as regras e têm bom comportamento.
“O que esse projeto de lei faz é punir, porque atenta muito violentamente contra a dignidade humana que está prevista na Constituição Federal. [Pune] uma grande maioria daqueles que respeitam as suas limitações por conta de desvios que são praticados por uma minoria”, afirmou Gontijo, que também é doutor em direito penal econômico pela Universidade de São Paulo (USP).
Para Gontijo o aumento no encarceramento de presos não teve efeito negativo na criminalidade, pelo contrário.
Alternativas para a saidinha
Uma possível alternativa à “saidinha”, segundo o advogado criminalista Berlinque Cantelmo, seria a criação de “exames criminológicos” para identificar o perfil dos detentos que possuem ligações com facções criminosas. Segundo ele, uma vez identificada a relação, esses detentos seriam impedido de usufruir do benefício.
“Deveria existir a possibilidade de diretores de unidades prisionais levantarem informações acerca da permanência desses indivíduos em subcultura delinquente, isto é, a participação efetiva em organizações criminosas ou até mesmo a manutenção do mesmo comportamento violento, do mesmo comportamento voltado à prática reiterada de crimes”, sugeriu Cantelmo em entrevista ao g1.
REVEJA VÍDEOS DA EPTV:
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