A determinação do governador de Minas Gerais estabelecia regras para a obrigatoriedade da Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) a povos tradicionais do estado. A decisão pela suspensão foi do ministro Flávio Dino. Indígena com a bandeira do Brasil em manifestação contra o Marco Temporal em Roraima
Caíque Rodrigues/g1 RR
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, nesta sexta-feira (24), o decreto do governador Romeu Zema (Novo) que estabelecia regras para a obrigatoriedade da consulta prévia aos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais que vivem em áreas afetadas por licenciamentos ambientais.
A Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) é uma garantia dos povos originários, que assegura que essa população seja consultada sobre projetos de impacto ambiental nas áreas onde vivem.
A medida cautelar, assinada pelo ministro Flávio Dino, diz que Minas Gerais não tem competência para tratar do tema, já que assuntos sobre povos indígenas do Brasil são de responsabilidade da União.
A ação contra o decreto estadual 48.893/2024, de 11 de setembro de 2024, foi movida pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), cerca de dois meses depois da publicação do texto.
A organização defendeu que a ação do Governo de Minas é inconstitucional e restringe os direitos dos povos indígenas.
O que diz o decreto estadual
O texto do decreto 48.893/2024 estabelece uma série de regras para que CLPI seja feita nos territórios indígenas e quilombolas. Na prática, essas comunidades só seriam consultadas sobre modificações em seus territórios apenas se atendessem as seguintes regras:
Povos indígenas reconhecidos pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai);
Comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural Palmares;
Povos e comunidades tradicionais certificados pela Comissão Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais.
Entre outros pontos, o decreto define como terras indígenas apenas as que são demarcadas e homologadas pela União, além de dispensar a consulta “aos povos indígenas, comunidades quilombolas ou povos e comunidades tradicionais” que estão em área urbana.
O debate sobre a demarcação ocorre há mais de dois anos no país. A Lei 14.701 traz a previsão do Marco Temporal, e estabelece que os povos indígenas precisam estar habitando determinados locais em 5 de outubro de 1988, e a ausência de comprovação da presença da comunidade indígena nesta data invalida o direito à demarcação da terra.
Em novembro do ano passado, os povos tradicionais participaram de uma audiência pública para tratar as regras do decreto, alegando que o texto ameaçava a autonomia das comunidades frente à possíveis empreendimentos nas áreas onde vivem.
Ao g1, o advogado indígena e coordenador jurídico da Apib, Maurício Terena, explicou que o texto do governador é de caráter colonial, e vai contra a própria jurisprudência do Brasil.
“O Governo [de Minas Gerais] viola a consulta e tem um entendimento extremamente colonial do que diz respeito aos povos indígenas. O texto foi feito a partir de uma perspectiva de retirada de direitos. O Estado de Minas Gerais já tem um histórico de violação de direitos de povos indígenas. Levamos a questão para o Supremo para que as inconstitucionalidades sejam resolvidas”, disse Maurício.
O governador Romeu Zema, por meio da assessoria de imprensa do Governo de Minas, informou por nota que não comenta ações judiciais, e que “quando intimado, se pronunciará nos autos dos processos.”
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