O temporal arrastou veículos, quebrou muros e casas, deixando um cenário de destruição em 13 municípios do Sul do Espírito Santo. Ao menos, 20 pessoas morreram e mais de 17,7 mil ainda estão fora de casa. Luta pela reconstrução: sem previsão de quando rotina voltará ao normal em Mimoso do Sul
A noite do dia 23 e a madrugada do dia 24 de março entrou para a história do Espírito Santo após uma enxurrada deixar rastros de destruição em 13 cidades da Região Sul. O temporal arrastou veículos, quebrou muros e imóveis, deixando ao menos 20 mortos e mais de 15,7 mil pessoas fora de casa. Uma semana após a tragédia, completos nesta sexta (29), milhares de pessoas ainda tentam reconstruir suas vidas e não sabem como vão retornar à rotina normal.
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“A sensação que a gente tem é a de que está do mesmo jeito, todo dia igual, nada muda”, disse o aposentado Getúlio.
As mortes em decorrência da chuva foram registradas em Mimoso do Sul (18 vítimas), onde uma pessoa continua desaparecida, e também em Apiacá (2 mortos). Mimoso é uma das mais atingidas, com maior número de moradores sem suas casas e cenário de guerra.
De acordo com o boletim extraordinário divulgado pela Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa Civil do Espírito Santo (Cepdec), divulgado às 11h desta quinta-feira (27), 15.191 pessoas estavam desalojadas (que foram para residência de familiares ou amigos) e 513 desabrigadas, isto é, perderam o imóvel e foram encaminhados a abrigos públicos no Espírito Santo.
Diante do volume de chuva e do tamanho da destruição e dos prejuízos, o governo do estado decretou situação de emergência em 13 cidades da região. Foram elas: Alegre, Alfredo Chaves, Apiacá, Atílio Vivacqua, Bom Jesus do Norte, Guaçuí, Jerônimo Monteiro, Mimoso do Sul, Muniz Freire, Muqui, Rio Novo do Sul, São José do Calçado e Vargem Alta.
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Além de vidas perdidas, o prejuízo passa pela perda de roupas, móveis e documentos. Muitas famílias perderam tudo. A força da água quebrou muros, derrubou paredes de residências, invadiu lojas, escolas e prédios públicos, arrastou carros e caminhões.
Nesta quinta-feira, a Marinha do Brasil informou a chegada de um grupo com 83 fuzileiros para ajudar as comunidades mais afetadas em Mimoso do Sul e Apiacá. O grupamento conta com 15 viaturas. As equipes trabalharão no desbloqueio de vias, transporte de suprimentos especiais, distribuição de água, e outras atividades.
Comerciantes calculam prejuízos após enxurrada que devastou Mimoso do Sul, no ES: ‘Vamos lutar e conseguir de novo’
Os moradores perderam bens, alguns parentes, mas o que não falta é esperança. Desde a tragédia, os dias são de recomeços. A reconstrução começa os poucos. Como a lama ainda é grande, muitas famílias continuam limpando residências, comércios, espaços públicos… O que não falta também é força. Muitos, mesmo após perdas, ajudam uns aos outros.
A corrente de solidariedade extrapolou divisas. Capixabas de norte a sul se mobilizaram e enviaram água, roupas, alimentos, itens de higiene pessoal e limpeza. É uma rede de apoio.
Mimoso do Sul
Um dos municípios mais atingidos pelo desastre natural foi Mimoso do Sul, onde 18 das 20 mortes foram registradas até agora; uma pessoa continua desaparecida.
Mimoso do Sul em 2022 e em 2024 durante as chuvas de março
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De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 24.475 habitantes vivem na cidade. Após as chuvas, 5,1 mil tiveram que sair de casa, sendo 5 mil desalojados e 100 desabrigados.
Mesmo uma semana após as chuvas, diversos pontos da cidade ainda estão tomados de lama e nenhuma loja da cidade conseguiu retomar às atividades. Os comerciantes ainda tentam fazer a limpeza dos estabelecimentos, e a maioria estima perda total de mercadorias e equipamentos.
Dinomar dos Anjos, proprietário de uma loja de roupas no centro de Mimoso do Sul, estima um prejuízo de R$ 1,2 milhão
TV Gazeta
Um dos comerciantes que perdeu tudo foi o Victor Azevedo, que tinha uma loja voltada para serviços de xerox, jogos eletrônicos e manutenção de computadores.
“Não deu para recuperar nada. Foi 100% de perda. Parece que esses cinco dias vão virar 10, 15, 20… Até a cidade conseguir voltar a viver vai demorar bastante”, disse o comerciante.
Comerciante perdeu tudo em Mimoso do Sul, no Sul do ES
Reprodução/TV Gazeta
Maythê Bullos, proprietária de uma farmácia no centro da cidade, conta que na sexta-feira (22) esteve no comércio para subir alguns produtos das prateleiras quando recebeu os alertas de chuva.
A ideia era tentar minimizar os possíveis prejuízos, mas a quantidade de água foi muito acima do esperado. Não teve jeito: as mercadorias foram levadas. Outras ficaram boiando, sujas, na loja.
Maythê Bullos, proprietária de uma farmácia em Mimoso do Sul, lamenta a perda do estabelecimento. Espírito Santo.
TV Gazeta
“A gente veio e levantou as coisas porque esperávamos que chovesse como sempre, quando sobe uns 30 centímetros. Mas acabou tudo. Eu perdi minha farmácia, foram 15 anos perdidos, é desesperador”, falou.
Em lágrimas, a proprietária do local pede ajuda para ela e tantos outros comerciantes da região que estão na mesma situação. Ela disse não saber de onde tirar o sustento para a família.
“O teto está caindo na nossa cabeça, não conseguimos tirar as coisas, não tem da onde tirar nada para recomeçar, não sobrou nada! Olha essa cidade, a gente precisa de ajuda”, lamentou.
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Durante o temporal, considerado a pior enchente da história do município, choveu mais 150 milímetros de água, quantidade superior ao esperado para todo o mês de março. Em algumas localidades do Sul do estado, o volume foi de 300 mm.
Com o alto volume de chuva, o Rio Muqui, que corta a cidade, transbordou. Dezenas de veículos e até um caminhão do Corpo de Bombeiros foram arrastados pela chuva. A força da água quebrou até portões de ferro e levou casas inteiras ao chão.
Destruição em Mimoso do Sul, no Espírito Santo, após enxurrada
Fernando Madeira/Rede Gazeta
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Voluntários
Em meio ao cenário de destruição, a solidariedade tornou-se uma das responsáveis por levar água, colchões, cobertores, roupas, produtos de limpezas e alimentos para as vítimas das chuvas. A ajuda chega de todos os lados.
Alimentos doados chegam para serem distribuídos em Mimoso do Sul, Espírito Santo
Divulgação
Em Mimoso do Sul, a sede Cooperativa de Laticínios de Mimoso do Sul (Colamisul) tornou-se um centro de distribuição de donativos. Até uma cozinha improvisada foi montada para atender os moradores. Mesmo sem muita estrutura, moradores e voluntários se revezam fazendo marmitas para aqueles sem casa e até os outros que estão na cidade para ajudar.
De Vila Velha, na Grande Vitória, um grupo de motociclistas atravessou 174 quilômetros com três carros carregados com botija de gás, água, roupas e até um fogão. Além dos suprimentos, as motocicletas usadas em viagens agora também servem para levar as doações a bairros ainda difíceis de acessar.
Motociclistas levam ajuda a Mimoso do Sul, no Sul do ES
Reprodução/TV Gazeta
Os municípios próximos também disponibilizaram servidores para ajudar as cidades mais atingidas, a exemplo da voluntária Hellen Ramalho, que trabalha na Prefeitura de Presidente Kennedy.
“Estamos separando as roupas masculinas e femininas para facilitar no momento de enviar. Todas serão enviadas ainda hoje (ontem)”, explicou a servidora pública Hellen Ramalho, voluntária de Presidente Kennedy.
Atuação do Poder Público
Ainda no domingo (25), um dia após a enchente, o governo federal, por meio do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), anunciou que enviou uma equipe da pasta prestar apoio a municípios do Sul do Espírito Santo atingidos pelas fortes chuvas.
Governador Renato Casagrande (de boné) fala sobre a situação de Mimoso do Sul após chuva no Espírito Santo
Reprodução
Entre as medidas imediatas do governo do estado, uma delas foi a disponibilização do Cartão Reconstrução para as pessoas atingidas pelas chuvas no Sul do Espírito Santo. O benefício no valor de R$ 3,5 mil poderá ser usado para aquisição de móveis, eletrodomésticos, roupas, alimentos, material de construção ou qualquer item que a família entenda como prioritário.
Na terça-feira (26), o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, entregou o relatório inicial com as demandas de infraestrutura urbana, rural e rodoviária, além de habitação, com custo estimado em R$ 743 milhões. De acordo com o documento, será necessária a construção de 560 novas unidades habitacionais, além da reparação de quase 1,7 mil residências, com investimento previsto de R$ 275,3 milhões.
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